Arquivo para casa de criadores - Rodolfo

Entrevista com Jorge Feitosa, o cão de Inácio

Dedico esse ajuntamento em especial à São Jorge e a Ogum. Invisíveis reverenciados, por entre tantas dádivas, como guardadores da forja, do metal, da cutelaria. Afinal, a tesoura forjada em metal que uso para desenvolver o meu ofício é um instrumento de libertação para mim, desde a infância.

Registro fotografico: @agfotosite / @marcelosoubhia
Casa de Criadores 54ª edição – Ajuntamento #01|2024

Participando em mais uma edição do evento de moda Casa de Criadores em São Paulo, o santacruzense Jorge Feitosa segue sendo um expoente da moda baseada na cultura da Sulanca. Caminhando para evolução de suas narrativas nas roupas que costura, Jorge se ver agora como artista no que faz. Um novo passo destrinchado nessa entrevista que ele concedeu ao blog contando tudo sobre o seu momento e sua nova coleção intitulada: O Cão de Inácio.

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Rodolfo: Ano passado, você completou 20 anos de trajetória profissional na moda. Como você iniciou sua carreira e como foi o seu primeiro desfile?

Jorge Feitosa: Ano passado, 2023, completei 20 anos de trajetória profissional na moda, contando como marco inicial o meu primeiro desfile em 2003, que aconteceu no Teatro Municipal de minha cidade natal, Santa Cruz do Capibaribe/PE. O início das comemorações se deu pela realização da Exposição DO PRIMEIRO AO PRÓXIMO, que aconteceu de modo itinerante em dezembro de 2023 por três diferentes cidades de Pernambuco, sendo elas Santa Cruz do Capibaribe e Caruaru, cidades importantes no Polo de Confecções do Vestuário do Estado e na capital Recife. A ação contou com uma exposição (fotos, looks e meus cadernos de processos), um talk (onde eu contava um pouco dessa trajetória) e um desfile com dez looks representativos do trabalho que venho desenvolvendo, encerrando o evento em cada uma das cidades.

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Rodolfo: Pensando na sua trajetória, o que você considera o alicerce para sua caminhada na moda?

Jorge Feitosa: Ao pensar sobre como alinhar esta trajetória profissional, minha cabeça foi inundada por lembranças das coisas que realizei antes e que foram o alicerce para esta caminhada relacionada com a moda. Principalmente tudo aquilo que está atrelado ao meu universo infantil, já que comecei a brincar com a máquina de costura aos seis anos de idade.

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Rodolfo: Como foi sua infância e como ela influenciou sua carreira?

Jorge Feitosa: Sendo uma criança inventiva, eu vivia montando coisas, como carrinhos de lata, maquetes e livros com papelão, tijolinhos e bois de barro, naves espaciais e casinhas com restos de madeira, roupinhas de bonecas com retalhos. Ou vivia dançando, desenhando, brincando de “escolinha” na calçada da casa onde morava. Eu acabava brincando com tudo isso junto. E por isso mesmo, eu não era bem o modelo de criança que talvez os adultos em volta esperassem que eu fosse. Tido como arteiro, acabei ganhando um apelido da família do meu pai (que se chamava Inácio): “O Cão de Inácio”.

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Rodolfo: Você mencionou que seu apelido tinha a ver com sua inquietude. Como você via isso na época?

Jorge Feitosa: Pelo que lembro, nunca fui uma criança má. Mas, com o tempo, entendi que esse codinome foi dado porque eu não parava quieto, passava o tempo aprontando alguma brincadeira, que na maioria das vezes estava relacionada com a construção e elaboração de algo. Sempre costurando, serrando, colando, pregando, isso tinha a ver com o não acesso aos brinquedos comerciais. Já que minha família não tinha condições financeiras para adquiri-los, eu inventava os meus, em meio a estímulos — “Nossa que menino inteligente!” — ou comentários de desaprovação — “Isso é coisa de menina!”

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Rodolfo: Você acredita que sua infância influenciou diretamente sua trajetória profissional?

Jorge Feitosa: Costumo dizer que tudo que precisamos para nossa vida, recebemos quando criança. Toda ferramenta elementar está lá na nossa infância. Por isso, entendo que, para além de minha trajetória, este desfile/ajuntamento fala sobre todos nós. Sobre o que nos aconteceu quando criança e que nos colocou onde estamos hoje, sejam as coisas boas ou as que não nos deixaram tão contentes assim. Esta ação é um movimento para lembrar sobre o processo de SER, e não especificamente do ESTAR, pois ser professor, ser designer, ser estilista e ser artista, eu já o era, antes mesmo de estar aqui. Afinal, desde criança eu já era um cão arteiro!

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Rodolfo: Você tem uma mensagem para os pais sobre a criatividade das crianças?

Jorge Feitosa: Libertem as crianças do julgamento adulto. Estranho e inadequado é o olhar neutralizador sobre a infinita criatividade que elas cultivam.

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Rodolfo: Como você enxerga esse momento da sua carreira?

Jorge Feitosa: Esse momento é de assunção! De assumir para os outros, pela minha arte, o que cultivo desde sempre. Nada do que se possa ver é novidade, tudo é colheita. Tudo está guardado em mim, num relicário habitado pela minha criança.

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Rodolfo: Falando sobre os materiais que você usou nesta coleção, o que você destaca?

Jorge Feitosa: Sobre as matérias-primas usadas nesse ajuntamento que foram para a passarela da Casa de Criadores 54, além do reaproveitamento da própria produção, utilizei vários artigos da SANTISTA Work Solution – @santistaworksolution – e SANTISTA Jeanswear – @santistajeanswear -, com destaque para o artigo DENIM WORK com a tecnologia NO WASH produzido com algodão reciclado, sem necessidade de lavanderia. O tecido prêt-à-porter. Cortou → Costurou → Vestiu. O Denim da SANTISTA com conceito moderno, sustentável e original.

Conheça mais do trabalho de Jorge Feitosa em seu Instagram: @jorgefeitosa.jf

Sobre Rodolfo Alves

Sou publicitário que vivo criando conteúdos e ideias, fuçando novidades. Amo a comunicação e estou interessado pela moda no mundo: seja ela nas passarelas de grifes famosas ou nas feiras populares do Brasil.

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JORGE essa coca é Fanta

unisexy agênero para todo mundo | JORGE essa coca é fanta: a moda de Jorge Feitosa assume lugar na oferta de produtos sem distinção de gênero e rompe os muros de sua criatividade e masculinidade.


Gosto do termo “AJUNTAMENTO” usado por Jorge para dar nome ao que faz a cada nova coleção. E neste novo ajuntamento, desfilado na 48ª Casa de Criadores em agosto junta tudo, numa tuia de referências organizadas para ressignificar a si mesmo em seu processo de levar seu oficio para além das fronteiras de gênero.

Acompanhando o trabalho da Jorge Feitosa a marca e do Jorge Feitosa o estilista sulanqueiro, a mistura sempre constante do masculino e feminino sempre esteve presente nos looks apresentados a cada coleção, mesmo que nas entrelinhas sutis de seu zelo feminino pela execução das peças, pelo seu detalhismo constante nos recortes ou na robusteza das peças em grossos tecidos misturados com rasgos fragilizados. E não caiamos aqui no clichê de associar masculinidades e feminilidades arbitrariamente ao que seja robusto como masculino, ou frágil como feminino. É essa mistura de sensos que agora se materializa no ato criativo de Jorge, a marca e o homem.

Em conversas particulares sempre coube a observação de como a moda sulanqueira de Jorge alcançava as mulheres, mesmo com um direcionamento inicial tagueado como masculina. Em tempos como os nossos onde cada vez mais nos permitimos expandir limites e em flerte ou por determinação interna brincamos com as fronteiras de gênero e experimentamos em nós mesmos e mesmas nossos opostos, os looks de Jorge já viam prontos para esse tempo. Só faltava assumir, romper, abrir esse limite de forma mercadológica e conceitual.

E a culminância desse processo não poderia ter sido melhor entregue, se não nessa performance incrível do Ajuntamento # 01/2021 VER(E)A DOR – que ajunta a veio poeta do estilista numa narrativa atual e política ao tocar em temas como eleições, escolhas, votar, decisões. O poema diz: “ELEJA O AMOR PARA QUE NÃO PRECISE VER(E)A DOR!” e eu me pergunto de qual amor ele fala nessa coleção que assume os dois lados?, como é que Jorge escolhe agora sua assinatura de oferta de moda entre masculino e feminino? em qual dos dois Jorge irá votar?

Baseado nas memórias de sua vó Constantina, internada como louca, supostamente ao se apaixonar aos 80 anos, parece mesmo loucura Jorge nessa fase da carreira se apaixonar também pela dualidade de uma moda, vestir a camisa de uma marca que se faz nova, e surpresa! também carrega o tom feminino em cada pedaço de pano. E Jorge enlouqueceu, pôs-se na máquina a costurar, queria roupa de homem, queria de saia andar. Danou-se na tuia de pano e saiu-se a se reinventar.

O novo ajuntamento do estilista é cheio de significados guardados em processos internos carregados de amor. Em tempos difíceis como os atuais, as escolhas carregam em cada uma das possibilidades muitas responsabilidades, entre o feminino e o masculino, vemos o trabalho apostar no amor por ambos, votar no amor, descer de muros alheios e criar sem fazer escolhas por critérios fadados ao insucesso daqui pra frente.

Bacana de ver também é que esse criativo aflorado nas escolhas comerciais se volta para uma investigação interna, um processo profundo de análise da moda que ele sempre fez, e não meramente uma estratégica comercial com foco nas vendas, mas primeiramente numa entrega de si mesmo ao que a missão da costura lhe sobressai.


A constância do amor em nossas vidas nos pertence! Uma senhorinha se apaixonou por um conhecido vereador.
Mas, suas constantes declarações de amor não surtiam efeito sobre ele. Por ela ser casada, elegeram-na louca e a colocaram num hospício. Pobre senhorinha, já não bastava sofrer por ter o amor preso em si, foi enclausurada por amar.

Ver(e)a dor de perto apenas a fez entender que o que sentimos pelo outro, independe de resposta. Então ela juntou seus talhos, retalhos e transformou o amor pelo outro em amor próprio. E sua redenção aconteceu.

ELEJA O AMOR PARA QUE NÃO PRECISE VER(E)A DOR!
A COLEÇÃO

As peças super estampadas, com caimento leve, que fazem parte do ajuntamento VER(E)A DOR foram feitas com a técnica da Sulanca, num mix de 16 padrões exclusivos da parceira LUNELLI/@lunellitextil. A base têxtil utilizada foi o Rayon Bali (100% Viscose) em estampas rotativas e digitais, feita sob demanda, evitando desperdício de matéria prima como sobras ou estoques parados. A LUNELLI também produziu uma estampa exclusiva desenvolvida pelo estilista.

SUSTENTABILIDADE

Já os looks em denim com aspecto mais encorpado, foram feitos com o lançamento UPCYCLE CONCEPT da SANTISTA Jeanswear / @santistajeanswear, um denim mais sustentável, 100% algodão, com o máximo de fibras recicladas no urdume e na trama, sem tingimento, com mínima utilização de água no processo e resíduo zero através da reutilização da sobra de algodão gerada na fabricação.

CALÇADOS PADRONAGEM EXCLUSIVA DA COLEÇÃO

Dentro do pensamento e ação sobre a sustentabilidade, os calçados usados nesse ajuntamento são produtos da nova linha Renew da CONVERSE / @converse_br. As duas primeiras linhas da coleção incluíram o Renew Canvas, feito de poliéster 100% reciclado a partir de garrafas plásticas usadas, e o Renew Denim, incluindo tecidos reciclados cortados e criados na parte superior do Chuck Taylor e Chuck 70. O Renew Cotton, terceira linha da coleção, é feito de um novo processo que incorpora 40% de restos de lona de algodão reciclado da fabricação de calçados, criando um novo fio que se torna o tecido cru da parte superior da lona renovada. Todos os tênis foram customizados especialmente para a apresentação, com um padrão exclusivo desenvolvido pelo estilista Jorge Feitosa.

PARA COMPRAR

Todas as peças do vestuário e as bolsas desse ajuntamento estarão disponíveis para venda no site www.2collab.com.br

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PRODUTOS DA NOVA COLEÇÃO E JORGE FEITOSA

Sobre Rodolfo Alves

Sou publicitário que vivo criando conteúdos e ideias, fuçando novidades. Amo a comunicação e estou interessado pela moda no mundo: seja ela nas passarelas de grifes famosas ou nas feiras populares do Brasil.

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Coleção A FEIA FERA FEIRA (ou a REDENÇÃO da Santa Cruz) de Jorge Feitosa

A coleção Jorge Feitosa apresenta a Feira da SULANCA (feira de vestuário popular), que surgiu entre as décadas de 1960 e 1970, em Santa Cruz do Capibaribe, cidade do Agreste Pernambucano, como uma entidade divina, mística. O costureiro sulanqueiro Jorge Feitosa explica a linha de suas ideias:


“Apesar de simples e rústica (FEIA), a feira se espalhou pelo centro da pequena cidade mudando a realidade desse lugar. Foi engolindo tudo que pudesse ser motivo de estagnação (FERA). Transformando com o passar dos anos, a cidade onde surgiu, na principal produtora de confecções do estado (REDENÇÃO), livrando as pessoas da fome e da tristeza de ter que sair do seu lugar natal”.


Esse é o cenário poético do novo trabalho, que resume o culto a essa entidade “A Feira da SULANCA”, alimento vivo do seu ofício, com tudo de bom e de ruim que ela oferece. Percebendo a sua força, sua voracidade, seu exagero, Jorge diz continuar aprendendo com a feira, esse lugar de ajuntamento de diferenças, que o movimento do novo, só acontece quando há a disposição de todos.

Atualmente “a casa” da Feira da SULANCA em Santa Cruz do Capibaribe/PE, é o Moda Center Santa Cruz, maior centro de compras populares do Brasil, apoiador desse projeto!

Fotos: @niviamarcolinoo

Como referência gráfica, imagética, além das bancas de madeira utilizadas na Feira da SULANCA e suas “listas” em ripas de madeira, as xilogravuras do artista Gilvan Samico, entraram no mapa de inspirações de Jorge. Primeiro por ser admirador do seu ofício e por sua obra apresentar uma atmosfera divina, mitológica. Elementos esses, que estão presentes na narrativa da coleção.

MATERIAIS

A matéria prima deste trabalho, foi coletada no próprio estoque, marca presente no trabalho de criação de Jorge o manuseio de saldos, retalhos, sobras e aproveitamentos. Mas dessa vez, o sulanqueiro contou também com tecidos da VICUNHA TÊXTIL, que complementaram perfeitamente o mix de texturas e bases que usou na coleção.

Fotos: @niviamarcolinoo

CALÇADOS E MAKE

Os calçados são da colab MELISSA+RIDER, somando ao styling das peças a possibilidade urbana e versátil da moda feita por Jorge Feitosa. A beleza do desfile na Casa de Criadores foi assinada pelas parceiras MAC – Fabiana Gomes + CAPA – Jô Castro, tendo como referência a figura da carranca, a criatura mística e milenar, mas especificamente, a “carranca nordestina”, aquela que está presente nas embarcações do Rio são Francisco, justamente por se tratar de uma entidade que com sua cara feia e boca escancarada com presas afiadas, espanta as coisas ruins, afim de conservar, manter, proteger o que é bom.

Essa ideia foi estilizada por Fabiana Gomes no rosto dos modelos, seguindo também como inspiração o traço gráfico da xilogravura do Gilvan Samico, já citado aqui como uma das referências. Outra parceria que vale citar é o acabamento das peças e a presença da A SAN JORGE CONFECÇÕES/EXCLUSIVA que colaborou com a lavanderia dentro desse projeto.

Fotos: @niviamarcolinoo

O SUCESSO DA CARRANCA COUTURE

Vocês sabem do orgulho que Jorge Feitosa mobiliza em nós ao manipular sua forma de fazer roupas e sabem também que por isso mesmo eu me considero fã do sulanqueiro. Nesses dias que estive na casa de Jorge acompanhando o trabalho de finalização da coleção eu me envolvi como espectador e fiquei encantado com os processos, com a dedicação de Jorge ao seu trabalho.

Fotos: @niviamarcolinoo

Na lista de lembranças, conheci Jakson Araújo e amei o texto que  o mesmo publicou em seu perfil no Médio, cunhando o termo Carranca Couture. Vou deixar aqui linkado para que você também conheça. Abaixo alguns dos links que guardei de tudo que rolou durante antes, durante e depois da chagada de Jorge Feitosa na 44ª edição da Casa de Criadores.

Vogue anuncia o Line Up da Casa de Criadores – link
Texto de Jakson Araújo: link 
Vídeo do desfile no IGTV: link 

Site Lilian Pacce

DESFILE

A trilha sonora do desfile contou com o talento de Max Blum

 

 

Sobre Rodolfo Alves

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