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Experiências com a moda plus size no mercado local

São minhas experiências com a moda plus size no mercado local. E eu sou um homem magro. Escrevo sobre moda e trabalho com os mais diversos temas que envolvem as bolhas do próprio mundo fantástico da moda.

E eu preciso dizer sobre meu corpo magro, antes de começar o assunto, por que meu ponto de partida é um lugar de fala que apesar de também viver pressões estéticas a respeito do corpo (por ser magro, por ser magro com barriguinha saliente) esse mesmo lugar também carrega privilégios, limitações e interpretações simbólicas inalcançáveis sob a ótica de um corpo magro.

É justamente a relação com meu corpo que tem me levado a pensar sobre os corpos fora de mim, os outros corpos, e como consequência também pensar meu corpo além do que sempre fui ensinado a idealizar; que me deparei com a busca por vários conteúdos relacionados ao tema.

Esbarrei na moda plus size, um segmento de mercado no vestuário que tem crescido, acredito eu, pelo acesso e produção de informação e produtos para atenderem a diversidade cada vez maior de corpos.

Ouvindo o podcast projeto Piloto com Participação da Blogueira Ju Romano a gente aprende que o termo plus size é uma construção adequada para a moda enquanto segmento. Mas não exclusivamente para os corpos. Corpos são como são, plus size são produtos.

Outras experiências para além de meu próprio corpo aconteceram em meu trabalho. Fiz produção de fotos para uma marca local de moda plus size masculina e me deparei com sentidos novos e percepções diversas na minha relação com o trabalho, com o modelo e com a construção do material. Foi a primeira marca de moda masculina plus size para a qual que fiz produção fotográfica e atento a tudo anotei coisas que percebi durante o trabalho:

Confira aqui a matéria sobre a marca com as fotos produzidas

OS DISCERNIMENTOS DESSE TRABALHO – AS BRECHAS DE UM JOB PARA CORPOS PLUS SIZE

Essas minhas experiências com a moda plus size no mercado local começam muito antes, mas essas fotos foram o começo destas reflexões:

– em algum momento me veio na ponta da língua pedir ao modelo que secasse um pouco a barriga para que o enquadramento do look ficasse “melhor”, vigilante eu graças a Freud não soltei essa horrorosidade.

– noutro momento, assim como nós produtores fazemos em qualquer trabalho, precisei tocar o modelo, dobrar mangas da blusa, colocar um cachecol sem que houvesse a necessidade do cara sair da posição, para ganhar tempo, para não amassar a roupa e questões práticas de um trabalho de fotografia, nesse momento eu percebi de mim o cuidado com o toque ser diferente, e logo tratei de naturalizar.

Eu precisava recorrer ao que sempre faço com modelos magros e seguir o job. Mas eu sabia que esse cuidado de tocar, também estava presente no corpo a ser tocado, um homem gordo, heterossexual e uma bixa magra, serelepe fazendo gentilezas de arrumar a roupa. (digo isso, por que o modelo das fotos não é um modelo profissional, tivemos tremenda dificuldade em encontrar um rosto masculino profissional da área para fotografar, então direção de cena foi muito necessária, e esse caminho entra em contato quando tais pontuações não estão claras pelo viés profissional).

– sutilezas humanas todas presentes ali. E como estar atento a tudo isso me provocou pensar e construir algo sobre. Na edição dos looks e composição das peças… mais desafios/novidades. Como funcionam os volumes de um corpo gordo?, e as cores?, e as estampas?, quais calçados usar? Detalhes quase irrisórios, mas que eu senti brechas na minha habilidade quase automática de compor looks para corpos magros: quando o modelo terminava de vestir a roupa e ali eu sentia a necessidade de completar o look, ou de tirar algum acessório, tateando ideias sem nenhuma referência segura. Recorrer aos meus trabalhos anteriores com pessoas magras seria leviano e irresponsável.

– foi empírico e empático, me abri a possibilidade de aprender e me esforcei a fazer o resultado final ser bom, mas alguma insegurança se fazia presente, eu precisava honrar o trabalho com um bom resultado, precisava honrar a confiança da marca e mais que tudo precisava honrar a estética daquele corpo assim como ele era, sem permitir qualquer impressão arbitrária externa.

APURANDO OS ENTENDIMENTOS

Quantos espaços vazios essa relação de trabalho com a situação em si me provou. Você agora já sabe de meus pensamentos a mil enquanto fazia o job. Pedir que você se coloque no meu lugar seria conveniente, mas se coloque agora, no lugar daquele corpo, inábil em contar as sensações outras que sentiu, num blog abertamente para toda a internet…

Mesmo com toda pesquisa que fazemos para qualquer trabalho, na prática essa experiência foi interessante ao ponto de me instigar a descobrir nessas relações com os corpos, algo que também estava posto para mim: quando eu faço um selfie ou uma foto no espelho secando a barriga por exemplo. Borbulhou pensamentos e convites a reflexão. E depois de todo esse arrodeio, comecei a escrever essa matéria: experiências com a moda plus size no mercado local

COLABORADORES DESSA MATÉRIA
Experiências com a moda plus size no mercado local

Para isso, convidei amigos e uma amiga, todos gordos; para colaborarem com o conteúdo dizendo de suas experiências, pesquisamos juntos e aprendemos também. E agora queremos pensar essas coisas junto com você. Ouvi Henrique Marinho, modelo plus size, rei momo do carnaval do Recife, que também desfilou em terras agrestinas no EMP 2019 e Gabryel Lima, também modelo, também com atuação aqui no polo de confecções.

E como colaborada deste conteúdo, consultei Mila Vasconcelos, criadora de conteúdos relacionados ao corpo gordo, gordofobia, ativismo feminista e tantas outras coisas maravilhosas como ser host do podcast Songa Mongas. A bixa faz tudo, e também provador para marcas plus size.

CONTEXTUALIZANDO O MERCADO ATUAL

As mudanças não são poucas, e o mercado de marcas que atendem aos gordos e gordas tem crescido. Por um lado o desejo de identificação do público consumidor e sua busca por opções, tem motivado o surgimento de negócios de moda por todos os lugares.

Somente no catálogo de marcas do Moda Center Santa Cruz, um centro de vendas em atacado, o maior do Brasil e América Latina, o segmento plus size tem lugar de destaque no menu do aplicativo Moda Center e nesse mesmo, 8 páginas de marcas listadas no catálogo somente de moda plus size. Um exemplo do volume de marcas, produtos e conteúdos voltados para este público.

Além da ambiência de experiências com a moda plus size no mercado local o ativismo digital também tem motivado pessoas num processo incrível de aceitação do próprio corpo e levado consumidores e consumidoras a fazerem um movimento contrário na moda, buscando criar estilos para além das ofertas clichês de peças comuns, “adequadas” para os gordos apenas nos tamanhos e sem nenhum diferencial de estilismo contemporâneo.

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Pensar na fala de Elsa Schiaparelli que diz: “As roupas não devem ser adaptadas ao corpo, é o corpo que deve ser adaptado às roupas.” é tão piegas quanto delimitar regrinhas de pode e não pode para os corpos gordos; segundo Mila Vasconcelos, os corpos gordos podem vestir tudo, vestir o que quiserem e como quiserem, disfarçar a gordura, as formas e como esses corpos são não faz parte desse estilo pensado para aceitação completa.

Veja o vídeo que Mila produziu para o Box Fashion – cortesia e gratidão

Sendo assim ou as marcas se alinham as novas formas de pensamento coletivo em constante construção de auto imagem, ou valores ditatoriais como este citado acima da estilista Elsa Schiaparelli farão marcas e negócios se tornarem obsoletos até mesmo na razão de existirem (sim, estamos discutindo esse ponto em 2020, ainda): isso para todo o mercado, seja de marcas especializadas em tamanhos menores ou maiores, varejistas ou atacadistas.

Além do exemplo dado por Mila Vasconcelos acima, vou distribuir pela matéria, posts do Instagram de vários criadores e criadoras de conteúdos que são encantadores para você conhecer. Aff que tudo!

https://www.instagram.com/p/B8rlXnwJQjp/?utm_source=ig_web_copy_link
O modelo internacional Zach Milo em foto para campanha da Dolce Gabanna

Campanhas diversas também tem sido colocadas na rua endossando esse momento discursivo das marcas, assumindo espaços de diversidades, buscando dialogar com o público plus size. A exemplo da campanha recente da Calvin Klein que estampou mídias diversas com a modelo Jari Jones.

https://www.instagram.com/p/CBv8G9ODBmT/?utm_source=ig_web_copy_link

PLUS SIZE DO AGRESTE PERNAMBUCANO

Por aqui o mercado de modelos Plus Size tem trazido novos rostos, como a modelo Karla Ferreira, que desfilou como convidada para abrir o desfile do Coletivo Criativo no EMP 2019. A modelo também já foi convidada para fotografar com uma marca no Sul do país, e isso importa pela visibilidade e reconhecimento d seu trabalho fora do eixo de cidades do polo na rota da moda do agreste. Arrasou Karlinha!

https://www.instagram.com/p/B5Id_vol4TR/?utm_source=ig_web_copy_link

A experiências com a moda plus size no mercado local trás vivências promissoras e relatos de insucesso que acompanham o mercado local convivendo juntos, jobs onde modelar como plus size é por vezes precarizado, num mercado que cresce os bolsos de quem produz mas deixa a mercê a cadeia criativa que faz encher os bolsos dessa mesma moda, envolvendo assim o trabalho desvalorizado de modelos plus size.

Imagine você, se o trabalhos de modelos ‘padrão magro’ tem sido reduzido à cachês cada vez menos possíveis, como deve estar o trabalho de modelos plus size? Some na conta a profissionalização do setor que nunca se estabeleceu de forma planejada e efetiva na cena local.

A fala do modelo fotográfico Gabryel Lima ilustra bem os extremos pensados aqui, onde a valorização do trabalho desses modelos está sempre na berlinda:

https://www.instagram.com/p/CDSTKu3Htvs/?utm_source=ig_web_copy_link
Gabryel Desfilando na passarela do EMP 2019

Experiências com a moda plus size no mercado local por Gabryel Lima

A moda plus masculina foi ganhando espaço aos poucos no polo de confecções, no entanto ainda com uma baixa oferta para a demanda que temos no setor. O meio digital está vindo com muita força e isso é um ponto muito positivo, pois, é onde eles podem mostrar para um público ainda maior que sua marca está com essa proposta e isso é interessante para marcas pequenas, digo que é um diferencial gigante entrar nesse meio. Em virtude dessas divulgações, podemos dizer que sim, já existem modelos que fazem esse trabalho, mesmo que ainda muito pouco no masculino, mas tem, e as marcas precisam apostar mais nesse mercado e tenha certeza, será crescente o desempenho.

Eu como modelo, sim, tenho um pouco de dificuldade em estar realizando trabalhos por que no momento, existem poucas lojas com essa pegada plus size masculino e isso acaba dificultando um pouco o trabalho de modelo e também de influencer, mas, já estive fotografando para marcas de Toritama e desfilei para a Rastro Ativo em 2019 pelo EMP em Santa Cruz do Capibaribe, me deu uma visibilidade boa mas, o que impacta mesmo é a aposta das marcas para esse público.

Outra fala alinhada nesse olhar é do modelo Henrique Marinho, Rei Momo do Carnaval de Recife em 2015 e 2019.

https://www.instagram.com/p/CAKsks_HVxy/?utm_source=ig_web_copy_link

Experiências com a moda plus size no mercado local por Henrique Marinho

“As mídias sociais trouxeram um olhar mais aberto sobre o assunto através dos influenciadores digitais e com isso, a moda está mudando e fugindo um pouco dos “padrões”, criando relações mais íntimas com seus consumidores, defendendo causas, procurando ouvir mais. Porém com tanta evolução no mercado da moda, o plus size masculino ainda é pouco explorado e quem veste o tamanho GG ou mais, já percebeu que há pouca variedade na oferta roupas, deixando o vestuário esbarrar no preconceito e padronização magra de “beleza.

Enquanto modelo plus size vejo o crescimento da área a cada dia, incentivando homens e mulheres a sonharem, tornando possível um “mercado que não foi feito para o gordo”. Sempre existiu muito preconceito com os padrões não estabelecidos pelo mundo da moda, através da mídia, empresários, agências de modelos… Hoje todos estão se adaptando as mudanças no mercado da moda e entendem a “necessidade” de todos os perfis nas passarelas, publicidade… o consumidor precisa de Representatividade! Não só na moda mas em todos os lugares precisamos ocupar os espaços.”

POSTURA CONECTADA AOS VALORES

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Em minhas experiências com a moda plus size no mercado local me lembro claramente um caso de um tom arisco* (sendo eufemista) de empreendedores dizerem dos corpos gordos como quem lida com uma pessoa sem valor, dentro da ideia de estar fazendo um favor ao mercado oferecendo tais produtos.

“Produzir moda plus size é caro. Essas gordas ficam pechinchando preço pensando que a vida é fácil, eu gasto mais tecido para fazer a roupa delas. Se elas fizessem dieta não precisariam gastar mais com roupas grandes, né não Rodolfo?”

Arregalei os olhos. Constrangido não soube responder. E essa é muitas vezes uma fala comum, naturalizada numa bolha de entendimento onde o negócio está em primeiro plano, para além das relações que importam, onde novos moldes de relacionamento e convivência balizada pela moda, o estilo e o consumo se fortalecem. Nós não compramos mais para vestir, creio que compramos para nos relacionar.

DESAFIOS PARA UMA MODA MAIS INCLUSIVA

https://www.instagram.com/p/CCuLUwrp14o/?utm_source=ig_web_copy_link

Já que a geografia e as distâncias se apequenaram com a conexão digital, como nossas marcas, ainda não entregam um valor agregado que engaje clientes atacadistas e varejistas, no propósito de mudança social para o que estamos caminhando?

O que nos falta realizar ou perceber a respeito desse mercado que cresce, mas que não a qualquer custo? E o que nós, os criativos do polo de confecções podemos fazer para entregar e construir tais valores? Outra pergunta é: as marcas estão abertas para tal caminhada? Interessadas nesse novo (chama Cazuza aqui com o museu de grandes novidades)? Até mesmo ao entender que o polo performar com atitude mais industrial e menos branding, é possível criar esse valor para quem fabrica? Sigo refletindo.

Obrigadíssimo aos querides que colaboraram com esse texto. (por que diabos Rodolfo sempre erra o jeito de escrever as palavras, olha só, ele escreveu errado a palavra queridos?)

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Veja o que escrevi abaixo desse vídeo para pensarmos também esse conteúdo:

No começo do vídeo eu retiraria a fala sobre pessoas que estão “acima do peso” de quem? Do padrão? E corrigiria também: “com peças que você passe a impressão que você está grande, ao invés de gordo.” Ué, mas não é sobre aceitação? De quem é gordo e de quem não é?

Das 13 dicas eu recomendaria apenas a 03 sobre ajuste de peças. Recomendo mesmo ver o vídeo que a Mila Vasconcelos fez pra gente pensar sobre esse pode e não pode chato, para atender a um padrão de beleza.


Você sabia que existe uma semana de moda brasileira voltada para o segmento plus size? Confira: https://fwps.com.br/


No blog Moda para homens encontrei um texto bem legal, mais adequado para um olhar de stylist e menos cheio de pode e não pode. Recomendo a leitura.


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Imagem da capa Mila Vasconcelos por: @emyllemendes_

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Imagem original

Colaborou também com este conteúdo o incrível e maravilhoso, imenso e generoso Nestor Mádenes. Gratidão pelo olhar cuidadoso amigo!

Sobre Rodolfo Alves

Sou publicitário que vivo criando conteúdos e ideias, fuçando novidades. Amo a comunicação e estou interessado pela moda no mundo: seja ela nas passarelas de grifes famosas ou nas feiras populares do Brasil.

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