Arquivo para Agreste Pernambucano - Rodolfo

Experiências com a moda plus size no mercado local

São minhas experiências com a moda plus size no mercado local. E eu sou um homem magro. Escrevo sobre moda e trabalho com os mais diversos temas que envolvem as bolhas do próprio mundo fantástico da moda.

E eu preciso dizer sobre meu corpo magro, antes de começar o assunto, por que meu ponto de partida é um lugar de fala que apesar de também viver pressões estéticas a respeito do corpo (por ser magro, por ser magro com barriguinha saliente) esse mesmo lugar também carrega privilégios, limitações e interpretações simbólicas inalcançáveis sob a ótica de um corpo magro.

É justamente a relação com meu corpo que tem me levado a pensar sobre os corpos fora de mim, os outros corpos, e como consequência também pensar meu corpo além do que sempre fui ensinado a idealizar; que me deparei com a busca por vários conteúdos relacionados ao tema.

Esbarrei na moda plus size, um segmento de mercado no vestuário que tem crescido, acredito eu, pelo acesso e produção de informação e produtos para atenderem a diversidade cada vez maior de corpos.

Ouvindo o podcast projeto Piloto com Participação da Blogueira Ju Romano a gente aprende que o termo plus size é uma construção adequada para a moda enquanto segmento. Mas não exclusivamente para os corpos. Corpos são como são, plus size são produtos.

Outras experiências para além de meu próprio corpo aconteceram em meu trabalho. Fiz produção de fotos para uma marca local de moda plus size masculina e me deparei com sentidos novos e percepções diversas na minha relação com o trabalho, com o modelo e com a construção do material. Foi a primeira marca de moda masculina plus size para a qual que fiz produção fotográfica e atento a tudo anotei coisas que percebi durante o trabalho:

Confira aqui a matéria sobre a marca com as fotos produzidas

OS DISCERNIMENTOS DESSE TRABALHO – AS BRECHAS DE UM JOB PARA CORPOS PLUS SIZE

Essas minhas experiências com a moda plus size no mercado local começam muito antes, mas essas fotos foram o começo destas reflexões:

– em algum momento me veio na ponta da língua pedir ao modelo que secasse um pouco a barriga para que o enquadramento do look ficasse “melhor”, vigilante eu graças a Freud não soltei essa horrorosidade.

– noutro momento, assim como nós produtores fazemos em qualquer trabalho, precisei tocar o modelo, dobrar mangas da blusa, colocar um cachecol sem que houvesse a necessidade do cara sair da posição, para ganhar tempo, para não amassar a roupa e questões práticas de um trabalho de fotografia, nesse momento eu percebi de mim o cuidado com o toque ser diferente, e logo tratei de naturalizar.

Eu precisava recorrer ao que sempre faço com modelos magros e seguir o job. Mas eu sabia que esse cuidado de tocar, também estava presente no corpo a ser tocado, um homem gordo, heterossexual e uma bixa magra, serelepe fazendo gentilezas de arrumar a roupa. (digo isso, por que o modelo das fotos não é um modelo profissional, tivemos tremenda dificuldade em encontrar um rosto masculino profissional da área para fotografar, então direção de cena foi muito necessária, e esse caminho entra em contato quando tais pontuações não estão claras pelo viés profissional).

– sutilezas humanas todas presentes ali. E como estar atento a tudo isso me provocou pensar e construir algo sobre. Na edição dos looks e composição das peças… mais desafios/novidades. Como funcionam os volumes de um corpo gordo?, e as cores?, e as estampas?, quais calçados usar? Detalhes quase irrisórios, mas que eu senti brechas na minha habilidade quase automática de compor looks para corpos magros: quando o modelo terminava de vestir a roupa e ali eu sentia a necessidade de completar o look, ou de tirar algum acessório, tateando ideias sem nenhuma referência segura. Recorrer aos meus trabalhos anteriores com pessoas magras seria leviano e irresponsável.

– foi empírico e empático, me abri a possibilidade de aprender e me esforcei a fazer o resultado final ser bom, mas alguma insegurança se fazia presente, eu precisava honrar o trabalho com um bom resultado, precisava honrar a confiança da marca e mais que tudo precisava honrar a estética daquele corpo assim como ele era, sem permitir qualquer impressão arbitrária externa.

APURANDO OS ENTENDIMENTOS

Quantos espaços vazios essa relação de trabalho com a situação em si me provou. Você agora já sabe de meus pensamentos a mil enquanto fazia o job. Pedir que você se coloque no meu lugar seria conveniente, mas se coloque agora, no lugar daquele corpo, inábil em contar as sensações outras que sentiu, num blog abertamente para toda a internet…

Mesmo com toda pesquisa que fazemos para qualquer trabalho, na prática essa experiência foi interessante ao ponto de me instigar a descobrir nessas relações com os corpos, algo que também estava posto para mim: quando eu faço um selfie ou uma foto no espelho secando a barriga por exemplo. Borbulhou pensamentos e convites a reflexão. E depois de todo esse arrodeio, comecei a escrever essa matéria: experiências com a moda plus size no mercado local

COLABORADORES DESSA MATÉRIA
Experiências com a moda plus size no mercado local

Para isso, convidei amigos e uma amiga, todos gordos; para colaborarem com o conteúdo dizendo de suas experiências, pesquisamos juntos e aprendemos também. E agora queremos pensar essas coisas junto com você. Ouvi Henrique Marinho, modelo plus size, rei momo do carnaval do Recife, que também desfilou em terras agrestinas no EMP 2019 e Gabryel Lima, também modelo, também com atuação aqui no polo de confecções.

E como colaborada deste conteúdo, consultei Mila Vasconcelos, criadora de conteúdos relacionados ao corpo gordo, gordofobia, ativismo feminista e tantas outras coisas maravilhosas como ser host do podcast Songa Mongas. A bixa faz tudo, e também provador para marcas plus size.

CONTEXTUALIZANDO O MERCADO ATUAL

As mudanças não são poucas, e o mercado de marcas que atendem aos gordos e gordas tem crescido. Por um lado o desejo de identificação do público consumidor e sua busca por opções, tem motivado o surgimento de negócios de moda por todos os lugares.

Somente no catálogo de marcas do Moda Center Santa Cruz, um centro de vendas em atacado, o maior do Brasil e América Latina, o segmento plus size tem lugar de destaque no menu do aplicativo Moda Center e nesse mesmo, 8 páginas de marcas listadas no catálogo somente de moda plus size. Um exemplo do volume de marcas, produtos e conteúdos voltados para este público.

Além da ambiência de experiências com a moda plus size no mercado local o ativismo digital também tem motivado pessoas num processo incrível de aceitação do próprio corpo e levado consumidores e consumidoras a fazerem um movimento contrário na moda, buscando criar estilos para além das ofertas clichês de peças comuns, “adequadas” para os gordos apenas nos tamanhos e sem nenhum diferencial de estilismo contemporâneo.

https://www.instagram.com/p/CDg2L8fpfzs/?utm_source=ig_web_button_share_sheet

Pensar na fala de Elsa Schiaparelli que diz: “As roupas não devem ser adaptadas ao corpo, é o corpo que deve ser adaptado às roupas.” é tão piegas quanto delimitar regrinhas de pode e não pode para os corpos gordos; segundo Mila Vasconcelos, os corpos gordos podem vestir tudo, vestir o que quiserem e como quiserem, disfarçar a gordura, as formas e como esses corpos são não faz parte desse estilo pensado para aceitação completa.

Veja o vídeo que Mila produziu para o Box Fashion – cortesia e gratidão

Sendo assim ou as marcas se alinham as novas formas de pensamento coletivo em constante construção de auto imagem, ou valores ditatoriais como este citado acima da estilista Elsa Schiaparelli farão marcas e negócios se tornarem obsoletos até mesmo na razão de existirem (sim, estamos discutindo esse ponto em 2020, ainda): isso para todo o mercado, seja de marcas especializadas em tamanhos menores ou maiores, varejistas ou atacadistas.

Além do exemplo dado por Mila Vasconcelos acima, vou distribuir pela matéria, posts do Instagram de vários criadores e criadoras de conteúdos que são encantadores para você conhecer. Aff que tudo!

https://www.instagram.com/p/B8rlXnwJQjp/?utm_source=ig_web_copy_link
O modelo internacional Zach Milo em foto para campanha da Dolce Gabanna

Campanhas diversas também tem sido colocadas na rua endossando esse momento discursivo das marcas, assumindo espaços de diversidades, buscando dialogar com o público plus size. A exemplo da campanha recente da Calvin Klein que estampou mídias diversas com a modelo Jari Jones.

https://www.instagram.com/p/CBv8G9ODBmT/?utm_source=ig_web_copy_link

PLUS SIZE DO AGRESTE PERNAMBUCANO

Por aqui o mercado de modelos Plus Size tem trazido novos rostos, como a modelo Karla Ferreira, que desfilou como convidada para abrir o desfile do Coletivo Criativo no EMP 2019. A modelo também já foi convidada para fotografar com uma marca no Sul do país, e isso importa pela visibilidade e reconhecimento d seu trabalho fora do eixo de cidades do polo na rota da moda do agreste. Arrasou Karlinha!

https://www.instagram.com/p/B5Id_vol4TR/?utm_source=ig_web_copy_link

A experiências com a moda plus size no mercado local trás vivências promissoras e relatos de insucesso que acompanham o mercado local convivendo juntos, jobs onde modelar como plus size é por vezes precarizado, num mercado que cresce os bolsos de quem produz mas deixa a mercê a cadeia criativa que faz encher os bolsos dessa mesma moda, envolvendo assim o trabalho desvalorizado de modelos plus size.

Imagine você, se o trabalhos de modelos ‘padrão magro’ tem sido reduzido à cachês cada vez menos possíveis, como deve estar o trabalho de modelos plus size? Some na conta a profissionalização do setor que nunca se estabeleceu de forma planejada e efetiva na cena local.

A fala do modelo fotográfico Gabryel Lima ilustra bem os extremos pensados aqui, onde a valorização do trabalho desses modelos está sempre na berlinda:

https://www.instagram.com/p/CDSTKu3Htvs/?utm_source=ig_web_copy_link
Gabryel Desfilando na passarela do EMP 2019

Experiências com a moda plus size no mercado local por Gabryel Lima

A moda plus masculina foi ganhando espaço aos poucos no polo de confecções, no entanto ainda com uma baixa oferta para a demanda que temos no setor. O meio digital está vindo com muita força e isso é um ponto muito positivo, pois, é onde eles podem mostrar para um público ainda maior que sua marca está com essa proposta e isso é interessante para marcas pequenas, digo que é um diferencial gigante entrar nesse meio. Em virtude dessas divulgações, podemos dizer que sim, já existem modelos que fazem esse trabalho, mesmo que ainda muito pouco no masculino, mas tem, e as marcas precisam apostar mais nesse mercado e tenha certeza, será crescente o desempenho.

Eu como modelo, sim, tenho um pouco de dificuldade em estar realizando trabalhos por que no momento, existem poucas lojas com essa pegada plus size masculino e isso acaba dificultando um pouco o trabalho de modelo e também de influencer, mas, já estive fotografando para marcas de Toritama e desfilei para a Rastro Ativo em 2019 pelo EMP em Santa Cruz do Capibaribe, me deu uma visibilidade boa mas, o que impacta mesmo é a aposta das marcas para esse público.

Outra fala alinhada nesse olhar é do modelo Henrique Marinho, Rei Momo do Carnaval de Recife em 2015 e 2019.

https://www.instagram.com/p/CAKsks_HVxy/?utm_source=ig_web_copy_link

Experiências com a moda plus size no mercado local por Henrique Marinho

“As mídias sociais trouxeram um olhar mais aberto sobre o assunto através dos influenciadores digitais e com isso, a moda está mudando e fugindo um pouco dos “padrões”, criando relações mais íntimas com seus consumidores, defendendo causas, procurando ouvir mais. Porém com tanta evolução no mercado da moda, o plus size masculino ainda é pouco explorado e quem veste o tamanho GG ou mais, já percebeu que há pouca variedade na oferta roupas, deixando o vestuário esbarrar no preconceito e padronização magra de “beleza.

Enquanto modelo plus size vejo o crescimento da área a cada dia, incentivando homens e mulheres a sonharem, tornando possível um “mercado que não foi feito para o gordo”. Sempre existiu muito preconceito com os padrões não estabelecidos pelo mundo da moda, através da mídia, empresários, agências de modelos… Hoje todos estão se adaptando as mudanças no mercado da moda e entendem a “necessidade” de todos os perfis nas passarelas, publicidade… o consumidor precisa de Representatividade! Não só na moda mas em todos os lugares precisamos ocupar os espaços.”

POSTURA CONECTADA AOS VALORES

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Em minhas experiências com a moda plus size no mercado local me lembro claramente um caso de um tom arisco* (sendo eufemista) de empreendedores dizerem dos corpos gordos como quem lida com uma pessoa sem valor, dentro da ideia de estar fazendo um favor ao mercado oferecendo tais produtos.

“Produzir moda plus size é caro. Essas gordas ficam pechinchando preço pensando que a vida é fácil, eu gasto mais tecido para fazer a roupa delas. Se elas fizessem dieta não precisariam gastar mais com roupas grandes, né não Rodolfo?”

Arregalei os olhos. Constrangido não soube responder. E essa é muitas vezes uma fala comum, naturalizada numa bolha de entendimento onde o negócio está em primeiro plano, para além das relações que importam, onde novos moldes de relacionamento e convivência balizada pela moda, o estilo e o consumo se fortalecem. Nós não compramos mais para vestir, creio que compramos para nos relacionar.

DESAFIOS PARA UMA MODA MAIS INCLUSIVA

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Já que a geografia e as distâncias se apequenaram com a conexão digital, como nossas marcas, ainda não entregam um valor agregado que engaje clientes atacadistas e varejistas, no propósito de mudança social para o que estamos caminhando?

O que nos falta realizar ou perceber a respeito desse mercado que cresce, mas que não a qualquer custo? E o que nós, os criativos do polo de confecções podemos fazer para entregar e construir tais valores? Outra pergunta é: as marcas estão abertas para tal caminhada? Interessadas nesse novo (chama Cazuza aqui com o museu de grandes novidades)? Até mesmo ao entender que o polo performar com atitude mais industrial e menos branding, é possível criar esse valor para quem fabrica? Sigo refletindo.

Obrigadíssimo aos querides que colaboraram com esse texto. (por que diabos Rodolfo sempre erra o jeito de escrever as palavras, olha só, ele escreveu errado a palavra queridos?)

BÔNUS – CLIQUE PARA MAIS CONTEÚDOS RELACIONADOS

O primeiro ensaio fotográfico de um gordo – Stormsize


Negra, trans e plus size: modelo americana celebra campanha para Calvin Klein: “Momentos que ajudam a esquecer quando o mundo te disse ‘jamais” – Glamurama


Homens plus size conquistam o mercado da moda nacional e internacional – Correio Brasiliense


Veja o que escrevi abaixo desse vídeo para pensarmos também esse conteúdo:

No começo do vídeo eu retiraria a fala sobre pessoas que estão “acima do peso” de quem? Do padrão? E corrigiria também: “com peças que você passe a impressão que você está grande, ao invés de gordo.” Ué, mas não é sobre aceitação? De quem é gordo e de quem não é?

Das 13 dicas eu recomendaria apenas a 03 sobre ajuste de peças. Recomendo mesmo ver o vídeo que a Mila Vasconcelos fez pra gente pensar sobre esse pode e não pode chato, para atender a um padrão de beleza.


Você sabia que existe uma semana de moda brasileira voltada para o segmento plus size? Confira: https://fwps.com.br/


No blog Moda para homens encontrei um texto bem legal, mais adequado para um olhar de stylist e menos cheio de pode e não pode. Recomendo a leitura.


Curtiu esse conteúdo? O que você pensa sobre o assunto e sobre essas reflexões. Comente e compartilhe em suas redes sociais.


Imagem da capa Mila Vasconcelos por: @emyllemendes_

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Imagem original

Colaborou também com este conteúdo o incrível e maravilhoso, imenso e generoso Nestor Mádenes. Gratidão pelo olhar cuidadoso amigo!

Sobre Rodolfo Alves

Sou publicitário que vivo criando conteúdos e ideias, fuçando novidades. Amo a comunicação e estou interessado pela moda no mundo: seja ela nas passarelas de grifes famosas ou nas feiras populares do Brasil.

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FOTOGRAFIA DE MODA NO AGRESTE PERNAMBUCANO

Esta é uma matéria que atualiza outra. Anteriormente em dezembro de 2017 eu escrevia sobre 7 fotógrafos de moda para conhecer no polo de confecções e hoje para celebrar o dia do fotógrafo, da fotógrafa e da fotografia, refiz a lista me convidando a ver o cenário da fotografia em si, permeada pelos talentos locais, por isso o título desta atualização é Fotografia de moda no agreste Pernambucano.

Em 2017 minha preocupação era brifar talentos, mostrar eles ao mundo, e dizer que no interior do estado haviam nomes que significavam essa nova levada de criativos fazendo a moda local. Hoje, depois de dois anos os talentos até mudaram de nome, alguns não estão mais na carreira clicando, outros mudaram de segmento e novos nomes entraram para lista, bem como merecem ser citados quem continua a labuta de fotografar os looks das marcas locais.

Vamos então deixar a lista de nomes para o final, e antes disto pensemos como a fotografia de moda está funcionando enquanto mercado local.

Empasses atuais e valor profissional

Na matéria anterior ouvi os profissionais listados a respeito dos empasses que lidavam e me pergunto se hoje esses empasses foram superados. Receio que não. Como eu lido diretamente com esses profissionais, ainda acompanho o dilema da valorização dos talentos da fotografia, quando por exemplo, o assunto é orçamento e valor pelo trabalho.

Muitas vezes o olhar para estes profissionais se coloca no esquema do fast photo (relativo a fast fashion), que para atender demandas muito rápidas de produção da comunicação, sempre tem no escopo: muitas fotos, produção básica, edição rápida e remuneração mínima, onde para ter acesso a um valor maior, alguns profissionais oferecem mais quantidade de cliques, com edição ainda mais básica para uma entrega que acompanhe a velocidade por exemplo, das redes sociais.

Por falar em redes sociais, este é outro ponto que a meu ver está posto para levar os clientes a questionarem a validade do trabalho de fotografia profissional, uma vez que clicar com a prima da tia, num iphone pode ser mais ágil e mais barato que ter uma produção fotográfica profissional, a ponto de garantir a rapidez monstruosa que as redes ilusoriamente demandam (a gente sabe que marketing de conteúdo é outra história; o fast post também é um engodo, cá pra nós.)

Tendo tais pontos arrodeando o trabalho da fotografia de moda enquanto mercado na região, quais as saídas que eles e elas tem encontrado para se posicionarem aos clientes, aos concorrentes e a si mesmos?

Acompanhe as citações de cada um dos profissionais citados nas redes sociais do Box Fashion @oboxfashion.

Classe profissional e senso coletivo

Em 2019 um grupo de parceiros criativos (me incluo), juntou-se a/na CDL Santa Cruz para criar a então Câmara setorial de moda e criatividade, na ocasião eu claramente percebi que esse seria um trabalho muito inicial, justamente pelo feeling de entender nossa inabilidade (me incluo) de nos vermos enquanto setor coletivo unido (estrategicamente me refiro).

Fizemos diversos convites, encontro de formação da câmara e WhatsApp indo e vindo, para conseguirmos juntar (formação atual) 5 profissionais divididos em várias áreas. A da fotografia inclusive até hoje sem nenhum representante específico.

O que isso significa? Por que não conseguimos institucionalmente ou não, formarmos grupos ativos de colaboração estratégica para performar no mercado?

Segundo Sandra Roberta que é cientista social e pesquisadora do polo de confecções pela UNICAMP:

Sandra Roberta

…a ideia de ações coletivas no Polo de Confecções é ainda muito insipiente e historicamente não se observa tal tradição. Obviamente temos que considerar a importância das diversas atividades desenvolvidas pelas associações empresariais; no entanto, no que se refere às outras categorias ainda não é possível brindar grandes êxitos.

E não quero dizer com isso que já não existam intentos significativos. Pelo contrário, é possível identificar vários/as atores e atrizes que tentam construir no dia a dia espaços de discussão, reflexão e coletividade. E apesar de pontuais, tais ações são de suma importância para desenvolver na população do Polo de Confecções o senso de coletividade.

É cada vez mais urgente sair dos espaços privados onde a preocupação se encerra apenas na produção/venda da confecção e sobrevivência familiar e começar a participar ativamente dos espaços coletivos, colocando nas pautas das discussões as problemáticas que atingem a todos/as, a fim de conquistar melhorias no âmbito pessoal,profissional e social.

Outro ponto aberto na mesa para pensarmos é a seguinte questão: por que fotógrafos e fotógrafas de outras cidades tem sempre o valor agregado de um status maior que os talentos internos? Como essa tecitura se cria? O que esses profissionais de fora tem a nos ensinar sobre essa relevância de valorizar o próprio trabalho? Seriam cases de marca pessoal para a Débora Alcântara do Tudo Orna? Esse curso eu perdi.

Concorrência: a fotografia no atacado ou fast photo

Outro aspecto que circula o setor para além do desencontro estratégico enquanto classe, é a concorrência. Mesmo tendo um número quase infinito de marcas como potenciais clientes, mesmo com agendas lotadas durante o dia e noite com cargas de trabalho que beiram a exaustão física, emocional e mental, o setor se comporta repetindo no mercado da fotografia o mesmo pensamento da feira: vender muito e vender barato. Algo como fotografia no atacado. Deixando brecha para que a barganha estando no preço, nada precise ser feito de muito significativo ou criativo enquanto imagem de moda.

Nem vou citar aqui, o entendimento geral de que fotografia de eventos é mais valorizada que a fotografia de moda.

Ai ponha na lista os cursos de fotografia no celular que tem surgido por aqui, as inovações tecnológicas e a cultura de capital que pensa sempre o talento como um número no orçamento, antes de significar a entrega do valor simbólico e o resultado para a marca.

Valor simbólico X look book

O valor simbólico de uma fotografia de moda para a comunicação de uma marca, cria no consumidor o senso estético e o apelo necessários não apenas ligados ao interesse superficial da venda do produto em si.

Em tempos de marketing regido pela esfera do relacionamento (digital ou não), as histórias para contar que possam envolver os consumidores e lhes significar, reverberar para além dos sensos comuns, é algo que ainda não vemos com frequência nas marcas às margens da PE que corta o polo de confecções… uma necessidade que a minha geração tem tentado atender.

Dito isto, pense no exemplo da propaganda de calça jeans: sempre com uma modelo branca seminua, deitada na praia, a calça molhada, segurando os seios, com um homem branco malhado, segurando ela por trás sensualmente, e sorrindo como quem assiste ao Winderson Nunes no You Tube. Você já viu essa cena em quantas marcas de jeans?

Esse é o espaço criativo que a fotografia de moda, ainda não consegue ocupar. Não por limitação técnica dos profissionais, inclusive há muitos bons nomes e trabalhos muito significativos por aqui. Porém a excelência e relevância de tão poucos se perde no meio de tanto look book.

Nestor Madenes, fashion editor com vasta experiência inclusive com marcas locais reforça esse sentimento a respeito do momento atual na fotografia local:

Nestor Madenes

“A imagem de moda ainda não está consolidada. Outro polos como Brusque e também no Ceará podem ser listados com cases de marcas que já performam nesse direcionamento.

A imagem de catálogo é extremamente funcional ao que se propõe. Clicar e vender de forma ágil é super eficiente, mas isso diz respeito a comercialização de itens e não de ideias e isso não é imagem de moda.

O que sinto falta são os conceitos fashion, que vem antes até mesmo da fotografia em si. Nada acontece sem fundamento ou um referencial. Se o interesse é apenas a venda, o mercado performa bem. Mas essa cena já está anos luz em transformação mundo afora.”

Ponderações

Quando vim escrever esse texto e revisar a matéria de 2017, no último parágrafo da mesma eu sinalizei alguns pontos colocados nas escutas em diversos bastidores, que nos afligiam dois anos atrás. E sabe porque eu disse no início desta matéria que receava o cenário não ter mudado muito? Por que ele não mudou.

Vou repetir aqui os pontos listados desta vez em forma de tópicos, para ser mais lúdico e pensarmos juntos se eles permanecem ou se são coisas da minha cabeça:

  • medo da inovação estética por parte das marcas (e daria tempo?);
  • desvalorização da profissão pelos empresários que não percebem o valor agregado de uma boa foto;
  • a repetição de conceitos criativos pasteurizados que limitam a experimentação do novo (aquela foto da peça no tapete com florezinhas de plástico, o cabelo escovado e liso, a mesma pose, o mesmo homem fortão e a mesma gostosona de sempre);
  • e mais uma arara de problemas pendurados que são deixados de lado pela correria das vendas.

Então façamos outro questionamento a partir de uma fala bem grosseira que sempre resolve todo dilema com o seguinte clichê:

Como assim as fotos precisam ser boas?, eu faço no celular com minha filhinha de 4 anos e minhas peças vendem como água”.

E tá errado? Não está. Pensando em contextos o cliente que ainda tem esta visão, muito certamente pertence a um grupo de empreendedores, com uma visão do trabalho de moda ainda carente de entender a diferença básica entre preço e valor.

Isto também sinaliza a inabilidade da classe profissional de educar o público. Fomentar cursos de fotos no celular, é o tipo de tiro no pé que vem se repetindo comumente na mesma lógica da feira, preço acessível, curso rápido e etc. Soluções rasas para demandas profundas. Um talento do capitalismo.

É sempre importante pensar no contexto, para que fique claro que minha fala aqui não se trata de pessimismos, nem de azedumes arianos. Eu inclusive imagino que no mercado deva haver espaços para o maior mix de possibilidades criativas, inclusive com a fotografia de celular. Soluções são soluções e para quem empreende com a faca nos dentes como é no Brasil, quanto mais rápido e mais barato: melhor para quem faz.

O que ocorre nesta matéria de ser provocadora do pensamento e de reflexão quanto ao trabalho da fotografia localmente, é que estes empasses hora ou outra vão precisar ser olhados de frente. Pelas marcas, pelos profissionais e também por quem usa a nossa moda. Um ponto que já daria outra matéria: o público como variante desses empasses.

O quanto antes essa conversa começar, mais conseguiremos alinhar algo de sustentável para quem produz e para quem clica. No final das falas, o que teremos possivelmente pode ser uma imagem estonteante de moda, sedutora na medida certa do público a que se destina. E bem feita ao ponto de ser vista e pensada enquanto estilo de um talento que aperta o botão atrás da câmera.

Com todos os empasses e questões abertas, o Box Fashion tem como interesse fundamental de ser espaço de construção e diálogo, para criar novas formas, questionar e pensar a moda local. Agora vamos conhecer quem faz a fotografia de moda no agreste pernambucano. Mas acredite, ainda tem deles que precisam vender os jobs dizendo que está no começo da carreira.

Conheça quem faz fotografia de de moda no agreste pernambucano

RAMIRE LINS

Instagram: @ramire.lins

JUELAYNE GONDIM

contato: @juelaynegondim

ANDERSON CHAGAS

Contato: @anderson_chagass_

FELIPE LUCAS

Contato: @felipeportraits

GUILHERME SOUZA

Contato: @euguilhermephotos

ERIC MONTEIRO

Contato: @ericmonteiro

RUAN MARANHÃO

Contato: @ruanmaranhao

Sobre Rodolfo Alves

Sou publicitário que vivo criando conteúdos e ideias, fuçando novidades. Amo a comunicação e estou interessado pela moda no mundo: seja ela nas passarelas de grifes famosas ou nas feiras populares do Brasil.

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Entrevista: Arnaldo Xavier comemora 20 anos de Rota do Mar

Em 2016 a maior empresa de confecção do polo Pernambucano comemora uma trajetória de 20 anos no mercado de moda. Referência para os empreendedores fashion do mercado local e nacional o case de sucesso da Rota do Mar inspira diversos empresários e empresárias que lidam diariamente com os desafios de se fazer moda em nossa região.

 

As comemorações

Entre histórias construídas no dia a dia e contadas pelos funcionários, empreendedores, causos incríveis dessa trajetória de amor à moda a empresa lança ainda esse ano (junho/julho) um livro comemorativo com seu importante trajeto de modelo empresarial admirado e premiado pelo país. Também até o final do ano a Rota do Mar abrirá na cidade sede de seu parque industrial um museu da moda presenteando sua cidade natal com a história do polo de confecções. Exclusivamente para celebrar a data a confraternização de funcionários em 2016 concluirá o ano com motivos de sobra para festejar duas décadas no mercado numa festa em dezembro.

 

Atentos às novidades e valorização de nosso mercado, visitamos as instalações da empresa fundada em 1996, que conta atualmente com 500 colaboradores, produz 1,5 milhão de peças/ano e entrevistamos seus estilistas e seu empreendedor Arnaldo Xavier com EXCLUSIVIDADE. Confira a entrevista: Arnaldo Xavier comemora 20 anos de Rota do Mar.

 

Entrevista Arnaldo Xavier: empreendedor da Rota do Mar

Clique nas imagens para ampliar:

 

Box Fashion: Esse ano a Rota do Mar completa 20 anos no mercado e chegou onde um garoto que começou aos 15 jamais imaginaria. O que que aconteceu? Qual o segredo do sucesso para transformar essa empresa no que ela é hoje?

Arnaldo Xavier: Acredito que é você começar alguma coisa, um negócio, com um pouco de bagagem. Eu já tinha a bagagem de alguns anos de trabalho com minha mãe. Eu gostava do que fazia. Isso também soma à receita. O passo seguinte é montar uma boa equipe e ter pessoas boas para contribuir com o seu projeto. Convidamos pessoas capacitadas.

 

Box Fashion:  O que se passava na sua cabeça aos 15 anos de idade já embrenhado na sulanca?

Arnaldo Xavier: Eu estava empolgado, e vinha de um processo bem sofrido. Eu trabalhava em corte e costura. Eu já sabia pelo que trabalhava que havia algo melhor pra fazer e isso me empolgava. Nós pegávamos frete das senhoras na feira, vendi picolé em feiras, cocada nas ruas. Quando sai dessas profissões, eu me motivei muito. Passei a trabalhar como cortador, era uma profissão melhor.

 

Box Fashion: Desde o surgimento da empresa, muita coisa mudou no mercado de moda, local, nacional e global. O que mudou na empresa que marca precisamente a história das pessoas aqui?

Arnaldo Xavier: Tivemos momentos interessantes. No setor industrial, acho que lá pela década de 90 pra 2000, nós mantivemos presença forte em feiras e eventos e tiramos muito proveito dessa fase, a partir delas nós começamos a modificar nosso chão de fábrica, trazer tecnologia. No setor comercial o salto foi sair da cidade e montar outras lojas, a primeira em Caruaru deu muito certo. Hoje são 5 lojas e uma rede importante de 18 representantes pelo país. Na parte de estilo e moda, nosso marco de mudança foi a ousadia. Viajamos pra Londres, Califórnia, Havaí. Visitamos as grandes marcas e vimos onde a moda começa e passamos a entender disso melhor. Outra coisa muito positiva é que as pessoas que fabricam, as pessoas de dentro da empresa, passaram a usar a roupa. Isso não aconteceu no começo. Nosso argumento de moda está antenado com um público jovem e os nossos jovens trabalhadores na Rota do Mar participam na outra ponta também sendo consumidores. Isso é importante.

 

Box Fashion: Na rotina de trabalho dentro da empresa, como é o dia a dia de Arnaldo Xavier? Com o que você se envolve mais?

Arnaldo Xavier: É mais fácil eu dizer com o que eu não me envolvo.  Não tento ser centralizador, mas quero colaborar, dar ideias, participar, acompanhar. As reuniões de setores eu me envolvo muito.

 

“Só não vou mais pro corte de tecidos por que o pessoal não deixa.”

 

Box Fashion: Com quais processos você mais se envolve? Em que setor você deixa o coração?

Arnaldo Xavier: Eu gosto muito da parte de criação. Desenvolvimento de produtos novos… quando vejo uma ideia ganhar o papel e ser transformada na roupa real… isso me dá muito prazer em trabalhar com moda.

 

Box Fashion: Quais suas novas inquietudes? O que ainda lhe motiva a guiar a moda que a Rota do Mar vende?

Arnaldo Xaxier: Eu sou inquieto e insatisfeito. Acho isso bom. Significa que quando ainda estou insatisfeito com o que faço, essa inquietação me deixa motivado por que sei que a gente pode sempre fazer melhor. Vejo que a nossa estrutura pelo que conhecemos de empresas lá fora já garante que possamos fazer muito mais. Isso me motiva.

 

Superação

Rodolfo entrevista Arnaldo Xavier
Rodolfo entrevista Arnaldo Xavier – Fotos: Jakson Andrade

Box Fashion: Inúmeras histórias são e vão ser contadas sobre sua figura empreendedora. Mas como você próprio contaria num livro de poucas falas a história que você foi, de quem você é?

Arnaldo Xavier: Acredito que superação me representa. Posso e sei falar disso. Sai de uma situação e consegui crescer, em uma região onde é pouco provável que as pessoas cresçam e montei uma empresa num dos lugares mais difíceis de crescer. A gente construiu uma empresa próspera. Então posso falar em superação. Mesmo quando as pessoas não tinham o hábito de estudar, viajar e sonhar, nossa empresa é a prova de que as pessoas podem fazer todas essas coisas. Eu diria assim: que superação definiria essa trajetória.

 

Box Fashion: Em 20 anos de Rota do Mar os consumidores podem esperar da empresa alguma surpresa nas coleções de 2016?

Arnaldo Xavier: As coleções deste ano serão as melhores já desenvolvidas. Tenho uma certeza enorme disso. Ainda estamos no verão e eu já fico doido pra usar os produtos de inverno. Agora imagine isso no frio. A empolgação faz parte dessa aposta nossa de fortalecer a cada ano as coleções de inverno. Estamos observando até a temperatura dos meses frios há mais de 7 anos e observado o clima para programar coleções bem pontuais. Nós percebemos que o inverno está esfriando cada vez mais.

 

Box Fashion: E pra comemorar tanto sucesso? O que mais estão aprontando pra celebrar a data? Nos conte em primeira mão:

Arnaldo Xavier: Vamos lançar um livro previsto para junho ou julho. Isso você pode antecipar. Também vamos dar uma grande festa para os funcionários em nossa confraternização no final do ano. E vamos presentear a cidade com um Museu de corte e costura que contará a história do polo de confecções. Já temos envolvidos grandes profissionais. Terá maquinários antigos, tesouras e equipamentos junto a registros históricos da evolução do polo em vídeos e muitos outros materiais. Esse museu vai ocupar o espaço da primeira loja da Rota do Mar, onde começamos no centro da cidade.

 

Leia também as entrevistas com os estilistas Rayssa Átila e Agnaldo Felix, eles contaram em 4 perguntas tudo sobre o setor criativo da empresa. Clique nos nomes para acessar.

Sobre Rodolfo Alves

Sou publicitário que vivo criando conteúdos e ideias, fuçando novidades. Amo a comunicação e estou interessado pela moda no mundo: seja ela nas passarelas de grifes famosas ou nas feiras populares do Brasil.

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