Não faça. Seja!
Existem várias teorias sobre o surgimento das Drag Queens. A definição mais popular é uma abreviação da expressão “DRessed As a Girl”, que significa literalmente “Vestido como uma garota”. Essa expressão foi usada pela primeira vez por Shakespeare, em meados do século XVI e XVII no Teatro Elizabetano, onde mulheres não podiam atuar, ficando os homens responsáveis pela atuação em papéis femininos com muita frequência.
É necessário deixar claro que Drag Queen não tem nada a ver com condição sexual. Embora a maioria seja gays (Drag Queens) e lésbicas (Drag Kings), há também heterossexuais que fazem esse trabalho.
Um bom exemplo disso, é o brasileiro Luis Otávio, (45 anos, casado e pai de duas filhas) que tem como personagem a Lulu Show, onde anima festas em Belo Horizonte.
Vários filmes foram responsáveis por popularizar o mundo das Drags, como “Priscilla, a Rainha do Deserto”, “Para Wong Foor, obrigado por tudo”, “Party Monster”, “Madame Satã” (Lázaro Ramos), o musical “The Rocky Horror Picture Show”, entre outros.
Mas não podemos falar das Drag Queens de hoje sem primeiro sabermos do pontapé inicial de visibilidade delas na cultura pop: O CLUB KIDS.
O Club Kids foi um grupo de jovens norte-americanos liderados por Michael Alig e James St. James no final dos anos 80 e no início dos anos 90, que teve um impacto significativo em New York e em Londres.
Conhecidos pelo trajes exagerados e o uso de drogas desenfreado, o movimento Club Kids cresceu, viajando por todo os Estados Unidos com aparições em programas de televisão conhecidos na época.
Esse movimento foi reconhecido mundialmente após o lançamento do livro de memórias intitulado Disco Bloodbath,, escrito pelo próprio James St. James, que posteriormente foi relatado no documentário Party Monster, the Shockumentary (1998), e no filme Party Monster (2003).
Os Club Kids revolucionaram a moda, o comportamento e até a música dos anos 80/90, onde seu lema principal era: “Não faça. Seja.”. Junto dos Club Kids na luta pela visibilidade, e amiga pessoal de James St. James, estava uma das Drag Queens mais conhecida atualmente: RuPaul.
RuPaul é uma Drag completa: atriz, cantora, autora, modelo e apresentadora de um dos programas mais badalados da América, o RuPaul’s Drag Race, onde, entre quatorze super Drags é escolhida uma para ser a próxima Drag Queen Superstar da América. O reality deu uma visibilidade estrondosa para as Drags no mundo todo, revelando as mais poderosas e fashions para o cenário do Show Business atual.
RuPaul continua sendo a inspiração pra inúmeras Drag Queens que estão iniciando sua carreira, ou até mesmo as que possuem anos de experiência. Em qualquer aparição, ela causa espanto, emoção e admiração.
Sendo assim, RuPaul’s Drag Race não é apenas uma série de tv que dá visibilidade às Drags, mas um ato político que luta pelos direitos iguais, independente do gênero.
Como modelo, foi garota propaganda de várias linhas de cosméticos, incluindo a M.A.C, onde criou a coleção “VIVA GLAM” que destina 100% do seu lucro ao apoio à pessoas que contraíram HIV.
E assim como os Club Kids revolucionaram as décadas de 80/90, RuPaul veio pra revolucionar a nossa década. Sendo pela luta dos direitos, ou nos presenteando com Drag Queens cada vez mais fashion e conceituais, inspiradoras de moda e comportamento.
E por falar em moda, não podemos esquecer de citar o grande estilista Marco Morante, por trás da grife Marco Marco, responsável por promover o desfile mais super ultra hiper mega power gay de todos os tempos!
Marco já era conhecido no mundo fashion pelas suas colaborações com artistas como Cher, Katy Perry, Fergie, Ke$ha e Shakira, e recentemente assinou o figurino para a turnê de Britney Spears em Los Angeles.
Foi na semana da Moda em Los Angeles, lançando sua coleção da Primavera-Verão que em seus três desfiles, Marco contou um uma equipe bastante peculiar: poderosas Drag Queens de RuPaul’s Drag Race, transexuais divosas, Boys magia bailarinos da Madonna, pintosas fechando nos saltos, andróginos bafônicos e vários fashionistas do mundo LGBT.
No Brasil, e mais pertinho da gente, em Caruaru, Pernambuco, há uma cena de novas Drags. Entre elas, conversei com a Milkshake, conhecida pelo público caruaruense tanto por sua performance um tanto diferenciada, quanto por seu estilo conceitual, sendo esse, expressado em seus ensaios fotográficos intitulados como QUEEN INTERVENTION / QUEEN INTERVENTION COLORS.
Sim, eu já tive a oportunidade de vê-la em cena, e podem ter certeza, ela arrasa! MESMO! Entrei em contato com ela, e ela nos cedeu uma entrevista babalite.
Dá uma olhadinha aí:
#BOXF – Como escolheu esse nome?
Milkshake (Milky Shake no facebook, porque é como o site permite) veio da Drag na qual eu me inspiro mais que todas as outras: Milk. Eu sou um derivado dela XD
#BOXF – Com quantos anos decidiu se montar como uma Drag Queen, e o que te fez ter essa ideia?
Com 19. Quando conheci o Reality show “RuPaul’s Drag Race” foi como ser apresentado a um mundo completamente novo. Na 6ª temporada me afeiçoei ao estilo de uma Queen que eu não conhecia até então. A Milk.
#BOXF – Como você define a personalidade da sua Drag? Tem algo específico como referência?
Eu vejo a Milkshake como uma extensão de mim. Nossas personalidades são muito parecidas. Tanto que nem sei dizer onde acaba meu “eu” e começa ela, mas posso dizer que ela é extrovertida e não se importa de chegar no fim da festa com a make derretida, se ela estiver se divertindo. Meu close é no chão.
Minhas referências são muitas, e o que me deixou preocupado foi o fato de que as pessoas não as entendessem, mas hoje eu já nem ligo. Se alguém souber de onde vem minhas ideias já forma uma amizade.
Tenho muito de Bowie, Björk, Placebo, Velvet Goldmine e outros filmes, animações e culturas variadas ao redor do mundo (e a Milk também, é claro).
#BOXF – Como você acha que as pessoas enxergam as Drag Queens?
Não foram poucas as vezes que me olharam torto ou que tive de dar palestras sobre Drag, mas hoje em dia as coisas estão bem mais fáceis, acredito, mas ainda há aqueles que veem Drag como algo absurdo.
#BOXF – E você, como as enxerga, tanto as antigas como as atuais?
Arte viva. Um meio de diversão e muito mais que isso também. Um poder revolucionário nasce na pessoa que se monta, independente do sexo, sexualidade, gênero ou identidade de gênero (ou mesmo que essa pessoa saiba disso).
E uma observação para as novatas: SE DIFERENCIEM! NÃO EXISTE GRAÇA EM SER PRODUZIDA EM SÉRIE! PROCURE SEUS PONTOS DE ORIGINALIDADE!
#BOXF – Sobre RuPaul’s Drag Race, qual sua opinião a respeito da visibilidade que o programa possibilita?
O lado bom é que as pessoas passam a entender esse universo um pouco. O ruim é que vemos e veremos muitas que fazem só pelo close do momento, mas elas não são obrigadas não é mesmo?
E só mais um lembrete pros novatos (as): Não existe Drag apenas fora do Brasil. Nós temos Drags maravilhosas, muitas que ainda estão começando e não tem ideia do seu potencial mas um dia chegarão lá se tiverem a chance.
#BOXF – Qual tipo de roupas e acessórios prefere usar? Você mesmo faz ou compra em algum lugar?
Faço misturas do que for necessário pra compor um look. Só tenho um pouco de receio em vestidos porque não me dão a mobilidade que preciso (porque danço e pulo muito) e não tem muito a ver com meu personagem que também não é lá muito feminina (desmontado sou mais feminino que montado. Engraçado né? haha)
Vou de macacão à calcinha num piscar de olhos. Algumas coisas sou eu que faço e em boa parte com a ajuda de (pasmem) minha mãe!
#BOXF – No mercado da região há possibilidades acessíveis para a compra dessas roupas e materiais?
Mais ou menos. Algumas coisas conseguimos com facilidade por aqui. Outras só em outras cidades ou até mesmo países.
#BOXF – Como você vê a influência que a cultura Drag tem na moda de hoje?
Acredito que a cultura Drag traz mais do que só Drag pra moda. É mais tipo:
“Ah agora homens e mulheres finalmente perceberam que não existe roupa pra homem e pra mulher e podemos ousar mais? É isso mesmo produção? Costurem logo essas saias pra homens ou algo do tipo.”
É algo como a energia da ousadia sabe? Prova disso são os desfiles da Marco Marco.
#BOXF – E por último, mas não menos importante, o que é ser Drag Queen pra você?
Ser Drag é a minha extensão. É quando mostro ao mundo tudo que não consigo como Matthäus. É meu momento de ser artista, ser Diva, por meu salto, por ou não peruca que não sou nem obrigado e fazer meu show, me jogar de costas, ouvir o aplauso e animar a festa. Fazer amizades, borrar minha maquiagem e sofrer pra ir ao banheiro, chegar em casa com o pé doendo, tirar o salto e sentir o prazer de tocar o chão como um ponto final de orgasmo de uma noite maravilhosa.
Sendo assim, podemos a partir de agora ter um novo olhar crítico sobre o mundo das Drag Queens. Ser Drag não é apenas um homem que se veste de mulher. É antes de tudo, uma expressão artística, onde você é sua própria obra de arte.