BOI NEON ao bife cru sem filtro e sem sal, extraordinário
Boi Neon ao Bife cru, sem sal, sem filtro. De apelos extraordinários. Um pedaço de bife cru sem tempero e apresentado num quadro de milhões de pixels, sem filtro. E como é apresentado… Que dissimulado esse Diego Garcia (Diretor de Fotografia), que ódio da cara dele, como é que ele e Gabriel Mascaro (Diretor) conseguiram fazer isso? Uma Fotografia que parece provocar a gente o tempo inteiro, com uma câmera lenta e parada constante, com zoons tão delicados que te colocam dentro da cena, sem você nem se quer perceber como foi parar lá, uma sensação que sentia constantemente nos planos mais fechados. As cenas abertas são nada menos do que exuberantes e magníficas, como uma grande aquarela. É um vídeo-arte, com algumas cenas abstratas que são para o filme como a rima é para um poema. Nenhuma cena, nenhum quadro, é apresentado sem o propósito mínimo de ser poético e metafórico, sem um cuidado milimétrico de composição.
Extraordinário
O enredo é como um recorte da vida, sem acontecimentos extraordinários, sem nenhuma problematização eloquente. E como não pode ser eloquente um filme sobre um vaqueiro que quer ser estilista, que trabalha com uma caminhoneira mãe solteira? O roteiro, também de Gabriel Mascaro não apela com nenhuma problematização abordada nesse espetáculo (é muito mais do que um filme). E vamos lá: Nu masculino na tela; sexo na gestação; desconstrução de papeis e de gênero; um nordeste sem clichês; sexo e sexualidade; cultura híbrida, com um boi híbrido, pop, um boi neon no meio da arena da vaquejada… Tudo isso dentro de um mesmo filme. Ele é estupidamente simples e justamente por isso consegue ser tremendamente eloquente e extraordinário.
Eu me pergunto se o Gabriel Mascaro usou imagens, cheiros e sabores para escrever esse roteiro ao invés palavras. Eu me pergunto se ele deu um story board a Diego Garcia ou um abraço antes dele começar a gravar cada cena (Ok, eu estou sendo dramático, mas não me culpem, o filme me deixou ainda mais emotivo do que o natural). Amo cada vez mais ser pernambucano.
Raqueirão de meu deus do céu
E o que é Juliano Cazarré atuando (Ver Febre do Rato e Cerra Pelada), o que é a cara desse homem, o corpo, os braços, as pernas (as pernas), o abdome, a (parei)! Ele tem uma beleza rústica, forte, que não pede licença, e nem se desculpa (safadeza, da porra, homi te dana), e que assenta com perfeição ao cenário quente e árido do agreste, as cercas e os bois (que parecem ter sido inventados para as lentes de Diego Garcia). Se a beleza desse homem fosse um palavrão seria ‘Febe Tife’ ou ‘Grenguena dos Inferno’ dito com agonia de dentes trincados. E mesmo assim ele consegue criar um personagem delicado, genuíno, sublime exatamente como o filme é. Sem nenhum exagero.
Cacá vai virar meme, abestado
Eu não poderia deixar de comentar Cacá (Alyne Santana, que é de Santa Cruz do Capibaribe), que pra mim se tornou ídolo, inspiração, referencial. Não é uma tendência, Cacá é muito mais que um estilo, Cacá é uma filosofia de viver… Brincadeiras à parte Cacá na verdade sou eu, ou é você, ou é aquele primo, aquela tia, o nosso avô. Cacá e sua mãe (Maeve Jinkings) são o ícone da maneira como o nordestino se trata, tem amor, tem carinho, não tem delicadeza, não tem meia boca.
O filme mantém um mesmo ritmo lento do começo ao fim, com cerca de uma hora e trinta de duração quando chega ao fim você não acredita que se passaram 15 minutos. Belo, sublime, delicado, verdadeiro Boi Neon é o 3º longa de Gabriel Mascaro, seu primeiro foi o documentário Domesticas (onde os patrões eram convidados a filmar suas empregadas) e em seguida Ventos de Agosto.
Prêmios
Melhor Filme: Festival do Rio
Melhor Roteiro: Festival do Rio
Melhor Atriz Coadj: Festival do Rio
Prêmio Especial: Festival de Veneza
Mensão Honrosa: Toronto Film Festival
Melhor Filme: Adelaide Film Festival
Melhor Filmes: Warsaw Film Festival
Prêmio da Crítica: Hamburg Film Festival
Prêmio da Crítica: Panorama de Cinema
Prêmio Especial: Panorama Cinema
Prêmio Ficunam: Panorama Cinema
Mensão Honrosa: Panorama Cinema
Bruno Melo é estudante e pesquisador da graduação de Arte e Mídia – UFCG-PB. É ator e já atuou, produziu e dirigiu algumas peças na cidade de Santa Cruz do Capibaribe. Participa desde 2013 na produção do Festival Atos de Teatro Universitário do curso de Arte e Mídia e em produções multimídias e trabalhos de conclusão do curso, como instalações artísticas, peças teatrais, videoclipes, como assistente de arte e produtor. É idealizador de um projeto do amanhã: o Jogar Teatro com aulas aos sábados na Usina 321.